A Geologia e a Copa [1]
Geocentelha 319
O título poderia ser “A CAPITAL E A COPA” ou “ESPÍRITO E
EFEITO DAS LEIS”, cada um aproveitando aspecto sob o qual Belo Horizonte deve
preparar-se para receber visitantes comuns, os jornalistas esportivos e os que
virão atrás dos temas de interesse dos três turismos — lazer, cultura e
negócios. Confesso que o segundo seria mais atrativo e o terceiro mais
específico, mas minha luta pela disseminação do conhecimento geológico
determinou a escolha.
Dizia ex-professor meu em 1970 que para a sociedade o
geólogo era um estranho ser que descobria minérios e explicava terremotos,
pontuando o distanciamento quase supersticioso das sociedades modernas em
relação ao conhecimento geológico. Há razões profundas e sutis para isto, que
não estão em causa neste artigo, mas lembro ao leitor que, por ser a geologia a
ciência que reuniu os três pilares do conhecimento material — física,
química e biologia — para desvendar e pôr a serviço da humanidade os segredos
da Terra, resulta, de não ser difundido seu conhecimento, grande prejuízo
para as populações brasileiras. Sem ofensa ao leitor, trago-lhe
expressões de minhas preocupações a respeito, a primeira, citação de autoria
não anotada, segundo a qual grave não é a falta do conhecimento, mas a
indisposição de encontrá-lo. De fato, assim agindo a sociedade e o indivíduo
são com frequência atingidos por processos e acidentes geológicos que ocorrem
na terra com previsível regularidade. Outra expressão — a ignorância é o pedestal
da arrogância — traduz-se na elaboração de leis que demonstram a arrogância do
Homem sobre a Terra, exatamente o oposto do que se diz ao justificar tais leis,
cujo erro maior é afastar a busca do conhecimento contextual, em total
desacordo com a lógica e com necessidades reais das pessoas.
A edificação das cidades mobiliza naturalmente massas
geológicas, que precisam ser imobilizadas, como se fez recentemente na parte
alta da avenida N. S.ra do Carmo, próximo do Anel Rodoviário, o que deve ser
exatamente repetido no escorregamento perigoso e feio da curva do Ponteio
(“...para encobrir a feiura da rocha artificial que fere os olhos que chegam
para ver a capital”; este autor em “Iniciação de um geodependente”).
Essas massas e seus equivalentes antrópicos (entulho) devem
também ser dispostos para sanear brejos, do contrário Belo Horizonte corre o
risco de apresentar àqueles jornalistas e torcedores tudo o que a cidade
moderna deve evitar: Notoriedade pela feiura concentrada em pequenas mas
estratégicas áreas; notoriedade pela feiura e imundície de áreas palustres;
notoriedade por índices alarmantes de dengue. Notoriedade por estar, como o
resto do Brasil, com dezenas de anos de atraso tecnológico em comparação com
países periféricos da Europa e Ásia, dados como inviáveis em 1960.
Homenageio o ex-aluno e colega, Professor da UFMG Carlos
Maurício Noce, brilhante cientista, tão precocemente falecido.
Belo Horizonte, 19/11/10
Edézio Teixeira de Carvalho
Eng. Geólogo.
[1] O Tempo; O.PINIÃO; 20/12/2010; p. 21