Causas entrelaçadas [1]
Geocentelha 346
Houve tempo em que as pessoas estavam mais perto da
natureza, mesmo morando em cidades, então pequenas, e, no caso de Belo
Horizonte, curiosos deixavam suas casas para observar a cachoeira do Arrudas ou
do Onça; em São Paulo colega meu disse que não perdia uma cheia do
Piracicaba, e eu aos 8 anos não perdia uma do Gualaxo do Sul, ainda hoje só não
tão bonito quanto o que vi do Zêzere. Um conhecimento intuitivo vinha chegando
com o tempo e com o conviver.
Disse a um amigo que indivíduo que tenha aprendido algo útil
jamais se esquece, mas as nações se esquecem facilmente. Basta uma geração.
Tínhamos um curso universitário chamado História Natural, com ênfases em
geologia, geografia, biologia. Lembro-me de colegas das três ênfases,
observando-os de fora, notando que havia distinções filosóficas mais ou menos
profundas, mas respeito mútuo, porque discutiam temas ambientais cruzados e
todos ganhavam. Terminado o curso, ficaram as licenciaturas de geografia e
biologia em ambientes estanques, e não foi criada a de geologia, talvez com uma
de duas suposições absurdas, o bacharelado em apenas 20 cursos responder pela
demanda desses quadros, ou a matéria ser dividida apenas entre licenciados de
outras áreas. Talvez hoje o Brasil tenha uma única licenciatura geológica na
UNICAMP. Então, mesmo onde haja a matéria geológica no ensino fundamental em
geral, não haverá licenciados em geologia para ministrá-la. As outras
licenciaturas estarão sentindo falta do contraditório no ambiente escolar.
Bateremos cabeças na questão até reaprendermos.
Escorregamentos dependem, nas cidades, do contexto geológico,
dos modelos de assentamento adotados, nem sempre os mais lógicos, das
declividades e da forma de escavar e construir, e das chuvas. Estes são os
cinco fatores centrais. A geologia, na intimidade de cada contexto geológico
geral, abre inúmeros outros fatores.
Rios? Há pelo menos 3 grandes categorias: Os que nascem nas
cidades e sobre os quais elas teriam à partida pleno domínio (Arrudas e RMBH);
os que passam pelas cidades (Piranga e Ponte Nova) sobre os quais a cidade não
tem quase nenhum domínio, senão reduzir o inevitável risco de posição, e os
federais (Paraíba do Sul e Campos) sobre os quais nem o estado tem domínio.
Escorregamentos ampliam inundações, agora, e levam o reservatório geológico
para sempre. Perda de solo é perda d´água certa no futuro. Ponte Nova e Campos
dependem em primeiríssimo lugar da consciência verdadeira, solidária, sensível,
sem insensatez, das cidades a montante, acostumadas a descarregar jatos d’água
sobre as coirmãs; das áreas rurais (governo federal com seu ilógico Código
Florestal) e dos estados que estão a montante. Se não for assim, ficaremos à
mercê de batalhas por verbas baseadas em argumentos nem sempre bem
fundamentados, e muitas vezes oportunistas.
Dinheiro básico e bem dirigido, sim. Mas também reformulação
do ensino fundamental já.
Belo Horizonte, 07 de janeiro de 2012
Edézio Teixeira de Carvalho
Engenheiro Geólogo.
[1] O Tempo; Opinião; 11/01/2012;
P19
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