5 de março de 2012

Exclusão da liberdade

Exclusão da liberdade [1]
Geocentelha 347

“Criar centros de desenvolvimento da tecnologia da gestão à semelhança de centros temáticos que criou a EMBRAPA ...”. Ao refletir sobre a rua sem saída do Código Florestal (qualquer versão), lembrei-me da proposta que incluí no capítulo “A revolução geológica” do livro “Geologia Urbana para todos – Uma visão de Belo Horizonte” que começa com a citação de Han Yu, pensador neoconfucionista do século nono: “Quem se senta no fundo do poço para contemplar o céu há de achá-lo pequeno”. Vi na EMBRAPA o modelo operativo para a revolução geológica e no SUS a organização do Estado para o enfrentamento dos problemas geológicos do nosso cotidiano, especialmente o do risco. Esforços de escassa repercussão, porque desde então (1999), tivemos problemas com grandes perdas em Santa Catarina, serras fluminenses, Nordeste,  em nosso estado e tantos outros.

Sem razões para rever os modelos, envio à EMBRAPA (direção e pesquisadores) consulta que dispensa justificação: Dada a natureza experimental da pesquisa agropecuária, como tratam as áreas de preservação  nas pesquisas de campo? Para melhor esclarecer a profunda angústia que move tal pergunta, ponho-me em situações opostas, a primeira na de quem preza a liberdade que nutre a criação e a segunda na de quem acha que ela não vale nada. Na primeira, sendo a APP intocável, como conseguem aprovação para pesquisa experimental, por exemplo, de arroz plantado dentro d’água? Vocês têm o direito de pesquisar nas APPs, desde que tais ambientes sejam necessários à pesquisa. Sendo missão natural da instituição obter soluções para a agropecuária brasileira, como justificam o uso dos recursos que lhes passo por delegação ao governo, para fazê-las senão para repassar seus resultados a outros povos, visto que não serão usados aqui? Na segunda condição pergunto-lhes: Vocês estão fazendo experimentos de campo em áreas de APP? Quando foi que, como financiador de seus cometimentos científicos, lhes dei a liberdade de pesquisar o que querem, nas sagradas áreas de APP?

Alguns concordam quando digo que importante em política de ordenamento territorial é haver diretrizes gerais de preservação e de reabilitação de áreas degradadas diferenciadas conforme domínios geoambientais definidos por critérios geográficos, geológicos, físicos, químicos e biológicos. Em cada domínio, respeitado o percentual mínimo estabelecido, profissional habilitado fixará na propriedade as áreas de produção e de preservação. Às vezes dizem temer a transição. Não há o que temer: Congele-se o atual que a Lei determina para evitar retrocesso e acompanhem-se as mudanças autorizadas e determinadas pela nova lei. Extinguir-se-ão naturalmente dilemas absurdos como o exposto e o país se beneficiará imensamente do uso do fundamento científico, hoje não só dispensado, mas sujeito a ameaças de devastador efeito.

Uma idade média de mil anos pode suceder ao desvario de uma geração.      



Belo Horizonte, 24 de fevereiro de 2012

Edézio Teixeira de Carvalho
Eng. Geólogo.



[1] O Tempo; Opinião; p. 15; 27/02/2012


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