Combate a inundações [1]
Nem toda inundação é indesejável. As do Nilo fizeram riqueza e glória do antigo Egito. Às catastróficas, com grandes perdas materiais e humanas, impõe-se combate estrutural. Elas são o saldo das águas precipitadas em relação aos meios de descarga – evaporação, capacidade de absorção do terreno e de escoamento disponível nos escoadouros da área atingida. Não nos esqueçamos de que as grandezas acima têm um lado natural – as precipitações (1) – com limites variáveis no tempo; as condições atuais do terreno (2), e dos seus escoadouros (3), dentre os quais rios, represas (nunca totalmente disponíveis), reservatórios de espera, vulgarmente chamados piscinões, e reservatórios particulares ou caixas de captação.
Quando o fator natural 1 – precipitação – se mantém
“comportado” durante muito tempo, as pessoas arriscam mais,
aproximando casas novas e benfeitorias de margens inundáveis. Também o fazem
quando barragens (3) são feitas para conter águas fluviais, onde elas
podem ser duplamente surpreendidas, quando o volume de armazenamento seja
insuficiente, ou o reservatório tenha sido temerariamente mantido cheio
antes das chuvas.
Em cidade que cresça sem controle, escoadouros canalizados
(3) crescem como galhos de árvore, passando os eixos maiores de 10 km, para 50
ou mais. Torna-se aí praticamente impossível conter inundações ampliando o
diâmetro do tronco (Arrudas, Tietê).
Além dos métodos convencionais de combate às inundações, em
grande parte esgotados nas principais bacias, esse combate deve assumir ares de
guerra, no campo geológico (2), com estratégias e táticas. Se quisermos
vitória, esqueçamos a lei dos homens e demos vez às da natureza. Considerando
campos típicos, a inundação é multifatorial (1 – climatologia, meteorologia; 2
– geologia; 3 – hidrologia). O combate tem de envolver os três campos em
compartilhamento funcional, que nunca foi feito de modo sistemático. No campo 2
a presença geológica, que deveria ser dominante, é incipiente. Afastado o empecilho
da lei, que nos trata como se fôssemos burros, cito quatro
possíveis contribuições: a) Reabilitação geológica de áreas degradadas, por
exemplo colocando inertes no lugar certo, como fundos de voçorocas ou
vales de cabeceiras, tenham ou não nascentes, de pequena vazão; b) Imobilização
de massas geológicas por meio de sistemas transversais aos fluxos, a exemplo
das sabodams japonesas, substituindo a longitudinalidade especializada em jogar
água fora pela transversalidade que a conserva, sem inundar; c) reconectar as
águas meteóricas ao subsolo das cidades, hoje sedento; d) introduzir a reflexão
científica, inexistente nas leis de ordenamento territorial. Esgotado o
recurso, impõe-se a remoção. Exemplos de êxito há. É ver. Falo pensando nos
manifestantes de junho, e em parlamentares e executivos não preocupados com
estéticas capilares, que podem aproveitar o que disseram e o que ora digo.
Belo Horizonte, 01 de janeiro de 2014
Edézio Teixeira de Carvalho
Eng.o Geólogo
[1] O Tempo; Opinião; 22/01/2014; p.19
Nenhum comentário:
Postar um comentário