17 de janeiro de 2011

Ignorância do Inocentes

Ignorância do Inocentes [1]
Geocentelha 323

Já me declarei ignorante em muitas situações, especialmente sobre minha saúde. Hoje estou em caminho mais seguro e agradeço aos médicos. Todos têm direito à ignorância, inclusive executivos públicos individualmente. Exceção é o ente governo. Este não. Além do imenso pesar pelos mortos e atingidos pelas chuvas, confesso grande frustração pela pregação infrutífera. Face ao risco geológico a humanidade é criança debruçada na janela: não distingue o décimo andar do térreo. A ignorância que leva ricos e pobres a residirem em áreas de risco ou mal preparadas para seu controle tem explicações, que deveriam ser levadas em consideração antes de concluirmos que foram punidos por ela. Misturada com ignorância, real ou não, pode estar presunção de que aquele ente, mais capaz, já avaliou a situação e deu-a como boa.

Tem acontecido de tudo: A água retoma seu lugar nos fundos dos vales porque todo ano perde um pouco do solo poroso das terras altas, como vimos na serra fluminense, e fica sem lugar lá em cima; então tem de descer encontrando no caminho ruas e casas implantadas no lugar errado. O processo geológico não tem como repor esse solo lá no alto até o ano vindouro. Conclusão: Nem é preciso chover tanto para que a tragédia se repita; pode chover até um pouco menos. É claro que nas altas encostas, o terreno pode ser naturalmente instável e geólogos foram formados especialmente para serviços como o de identificar e avaliar instabilidades naturais.

Erramos também na geração de situações de risco impensáveis: Pode uma barragem feita, entre outras coisas, para proteger cidades vale abaixo, fazer o oposto? Tanto pode que se repete frequentemente. Portugueses costumam reclamar dos espanhois, que segurariam o que podem das águas do Tejo em Alcântara e quando a chuva vem em excesso, soltam tudo com Lisboa rio abaixo. Franco da Rocha (SP) é repetição exata de Lisboa no caso. Uma árvore matou uma mulher. Árvores têm matado pessoas porque, de repente, começamos a pensar, com proverbial ignorância, que árvores devem viver até morrer, o que na cidade é um absurdo, porque a Cidade é ente criado especialmente para substituir a primeira natureza por uma segunda, podendo admitir elementos da primeira, quando necessários, convenientes, sadios, conviventes.

Para a vida perdida sob a árvore, para fluminenses, paulistas e mineiros mortos, temos referência de valor recente de indenização dada pela justiça, a ser paga pela empresa do voo Rio-Paris. Afinal as mortes são todas iguais. Se os governos brasileiros, especialmente os legisladores, fazem tantas leis absurdas, façam agora pelo menos uma que amenize a dor ilimitada dos que perderam entes queridos: Indenização em rito sumário com tramitação preferencial e reformulação orçamentária determinada pelo tribunal. Talvez assim os governos do Brasil resolvam observar as leis que eles mesmos fizeram (Lei 6766/79 Art. 3, incisos I e IV).  



Belo Horizonte, 13 de janeiro de 2011

Edézio Teixeira de Carvalho
Eng. Geólogo.




O Tempo; Opinião; 15/01/2011; p.19

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