Colaborador da FIABCI/BRASIL (Federação Internacional das
Profissões Imobiliárias) comenta a situação crítica dos tombamentos no Brasil
em documento hoje publicado no jornal Estado de São Paulo e cita argumentos de
geologia urbana de Edézio Teixeira de Carvalho. Veja abaixo.
Sérgio Mauad (*)
Raízes, base do sólido e saudável desenvolvimento de
qualquer país, devem ser preservadas. Na sociedade, a memória histórica deve
sempre se somar ao nosso instinto desenvolvimentista, balizando regras básicas
do bom convívio social, em clima de harmonia entre hábitos e cultura regional,
para um avanço saudável. A sabedoria de cada povo está em discernir o que deve
ser tombado e preservado, e a que custo, sem impedir a evolução da natureza,
que busca seu próprio equilíbrio, e também o progresso de uma nação. Não é
exatamente o que vemos no Brasil.
Anos atrás, num congresso da Fiabci Mundial na Áustria, um
painel de debates sobre tombamentos, para preservação do patrimônio cultural,
mostrou-se especialmente rico em argumentos. Foram levantados prós e contras,
ao se avaliar um efetivo tombamento. Ouvimos opiniões bem embasadas, de
autoridades no assunto, mostrando como viabilizar tombamentos, o porquê de
fazê-los ou então o porquê de não fazê-los em determinadas circunstâncias.
Exemplo de apresentação.
Prevaleceram as opiniões que defendiam a preservação da
história, desde que não se desequilibrasse financeira e economicamente o poder
público nem os indivíduos ou empresas proprietárias dos imóveis a serem
tombados.
Chamou atenção debate fecundo entre representantes de dois
países de culturas e idades diferentes, Japão e Canadá. O representante japonês
defendeu a idéia de que o espaço urbano deve ser maximizado. Exibiu foto de um
casarão histórico no centro da cidade e pediu atenção para a arquitetura da sua
fachada. Apenas ela fora preservada, incrustada na fachada do novo edifício,
moderno, em um painel rente à calçada. Dizia ele: “Não podemos sacrificar a
transformação natural da cidade, que precisa atender seu crescimento orgânico,
daí ter sido mantida apenas a fachada histórica, preservada com uma placa
identificando e registrando sua memória.”
O representante do Canadá interveio mostrando que, para
tombar um edifício, particular ou público, a primeira premissa a ser respeitada
é que o país seja rico o suficiente para garantir sua conservação, manutenção e
uso adequado daquele bem.
No Brasil, temos assistido a discussões sobre tombamentos
carentes de visão assim mais abrangente. Refiro-me ao enfoque que leve em
conta, sim, a sustentabilidade e a preservação ambiental, mas que não despreze
esse dado concreto de suma importância: nossas cidades ocupam menos de 1% do
território nacional.
Recentemente, o geólogo Edézio Teixeira de Carvalho expôs
seu pensamento pela Internet sobre o tema, que reproduzo em parte aqui: “...não
podemos criar uma cidade aleijada só porque um pequizeiro está no caminho.
Daqui a 50 anos, o pequizeiro morre e a cidade leva seu aleijão até o final dos
tempos, porque ela é a única obra humana que foi concebida por um lado para a
eternidade e, por outro, exatamente para substituir a primeira natureza por uma
segunda, em que componentes da primeira podem ter lugar desde que necessários,
convenientes e conviventes.” E perguntava ele: “O que havia antes no local onde
foi construído o Louvre de Paris?”.
Quem olha uma planta de São Paulo com imóveis tombados ou em
fase de tombamento e fixa sua atenção nos trezentos metros em volta, fica
surpreso. Sua ocupação e o uso do solo são restritos, impondo-se como
verdadeiros quistos urbanos desafiando qualquer plano racional de diretrizes
para o desenvolvimento da área.
A condição deplorável em que se encontram vários imóveis
tombados como Patrimônio Histórico, alguns deles, inclusive, invadidos,
evidencia a ausência de políticas públicas consistentes para garantir a
preservação da memória. Afinal, vale para o urbanismo o mesmo que se aplica à
cabeça das pessoas: mente vazia é oficina do diabo. Melhor dizendo: lugares que
não têm uso produtivo acabam sendo ocupados por quem não tem nada a oferecer
para a cidade; é o risco latente de novas Cracolândias. Na questão dos
tombamentos, abraçamos o atraso.
São Paulo, 30 de março de 2011.
São Paulo, 30 de março de 2011.
(*) Sérgio Mauad é colaborador da Fiabci/Brasil,
ex-presidente do Secovi-SP e presidente da SMDI-Desenvolvimento Imobiliário.
Enviar comentários para sm@sergiomauad.com.br
Fontes:
Jornal Estado de São Paulo [consultado em 30 de março de 2011]
http://sergiomauad.com.br/post.php?ID=19 [consultado em 03 de dezembro de 2014]
Jornal Estado de São Paulo [consultado em 30 de março de 2011]
http://sergiomauad.com.br/post.php?ID=19 [consultado em 03 de dezembro de 2014]
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