9 de janeiro de 2017

GC 395 O Geólogo e a Serra

O Geólogo e a Serra
Geocentelha 395

     Moro em Belo Horizonte desde 1976 e confesso não ter estado muitas vezes na crista da serra do Curral mesmo sendo geólogo. Dia desses estive lá rapidamente e acrescentei às poucas imagens anteriores uma vista prodigiosa. Do ponto de vista da amplitude não direi que o cenário se compare ao do Cristo Redentor do Rio. Entretanto este, se é enriquecido pelo infinito mar, a baixada e a serra dos Órgãos, tem também favelas que lembram as trágicas exclusões, embora às quais a criatividade dos cariocas acrescentou românticas vistas da baía e da serra, bem exploradas por grandes cozinheiras na recepção de turistas europeus de ocasião.
   Tomo esta deixa para lembrar que do ponto de vista geológico há visibilidades a sugerir aos leitores, da serra do Curral, em certos aspectos até maiores que as do Rio. Trata-se do seguinte: do ponto de vista geológico a Serra do Curral é uma das mais extraordinárias exposições geológicas do Brasil não só porque é  muito rica, mas porque, diferentemente do Rio, é geologicamente mais diferenciada, e porque às feições naturais a mineração e a urbanização acrescentaram feições artificiais sob a  forma de paredões rochosos nas cavas de pedreiras e de minas e nos cortes das ruas, principalmente na Senhora do Carmo/356, embora nesta com um concreto projetado dispensável,  e Raja Gabaglia. Tais paredões, no caso da face norte, compreendem as escarpas de dolomito de mina a céu aberto que acrescentam às magníficas pedras rubras da escarpa a sul da praça do Papa (afloramento natural da formação ferrífera Cauê) o dolomito homogeneamente claro da formação Gandarela.

Escarpa das Pedras Rubras vista da praça do Papa
Escarpa final; depressão entre cristas; serra e subserra; centro da cidade.
A serra com elevador panorâmico proporcionaria visão deslumbrante de Belo Horizonte

    Continuando as exposições artificiais agora da cidade, descendo a Raja Gabaglia podemos ver o que o poema sugere; “Passe no talude rude de onde o bloco cadente do impuro quartzito sobre o filito luzente, rola na ribanceira ameaçando o vivente, e entra na procissão de costumeira torrente que desce à contramão desafiando o tenente; triste fim da formação neste momento presente, ela que foi esmagada, comprimida, estilhaçada por força mais competente, e merecia afinal descanso mais natural que a todo ser se consente, à sombra do bambuzal, à margem do rio corrente lavada pelo caudal de pureza reluzente”.
   Mais abaixo se vê o talude mais comportado e resistente do grupo Sabará e já chegando ao Arrudas na depressão periférica que reverencia a formidável cadeia, blocos e placas de itabirito e quartzito, escondidos, com seixos rolados de gnaisses visíveis na Câmara Municipal.
   A engenharia mineral, mãe de todas as demais, não se fez esperar e seguindo os geólogos naturais ou preparados, repetindo o que já fez no mundo todo, tirando a humanidade das cavernas, elevou a terra do queijo a nível mais promissor que o até hoje alcançado pelas Minas e pelos Gerais. A serra com suas exposições naturais e artificiais, é, para quem tenha olhos de ver, uma das paisagens geologicamente mais instrutivas do Brasil, entretanto com perigos e feiuras que devem ser controlados ou pelo menos mitigados (aproveito a ocasião, para estimular o otimismo dos leitores que conheçam bem a área, para perguntar-lhes se se lembram do verdadeiro canyon erosivo que acaba de desaparecer à esquerda de quem sobe a 356, logo após o viaduto do ramal ferroviário de Águas Claras.
    Para proporcionar ao belo-horizontino apaixonado uma visão de deleite e instrutiva, eu já teria dado à serra um acesso de subida por elevador nas pedras rubras e uma descida panorâmica por teleférico a um dos montes da sub serra do Cercadinho, que, para quem vem de sudoeste para nordeste ou que esteja a cavaleiro numa imagem zenital os magníficos portais formados entre a serra, a subserra, tendo a depressão do Gandarela de permeio.

Belo Horizonte, julho de 2015
Edézio Teixeira de Carvalho


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