O Geólogo e a Serra
Geocentelha 395
Moro em
Belo Horizonte desde 1976 e confesso não ter estado muitas vezes na crista da serra
do Curral mesmo sendo geólogo. Dia desses estive lá rapidamente e acrescentei
às poucas imagens anteriores uma vista prodigiosa. Do ponto de vista da
amplitude não direi que o cenário se compare ao do Cristo Redentor do Rio.
Entretanto este, se é enriquecido pelo infinito mar, a baixada e a serra dos
Órgãos, tem também favelas que lembram as trágicas exclusões, embora às quais a
criatividade dos cariocas acrescentou românticas vistas da baía e da serra, bem
exploradas por grandes cozinheiras na recepção de turistas europeus de ocasião.
Tomo esta deixa para lembrar que do ponto de
vista geológico há visibilidades a sugerir aos leitores, da serra do Curral, em
certos aspectos até maiores que as do Rio. Trata-se do seguinte: do ponto de
vista geológico a Serra do Curral é uma das mais extraordinárias exposições
geológicas do Brasil não só porque é muito rica, mas porque, diferentemente do Rio,
é geologicamente mais diferenciada, e porque às feições naturais a mineração e
a urbanização acrescentaram feições artificiais sob a forma de paredões rochosos nas cavas de pedreiras
e de minas e nos cortes das ruas, principalmente na Senhora do Carmo/356,
embora nesta com um concreto projetado dispensável, e Raja Gabaglia. Tais paredões, no caso da
face norte, compreendem as escarpas de dolomito de mina a céu aberto que
acrescentam às magníficas pedras rubras da escarpa a sul da praça do Papa
(afloramento natural da formação ferrífera Cauê) o dolomito homogeneamente claro da formação
Gandarela.
Escarpa das Pedras Rubras vista da praça do Papa |
Escarpa final;
depressão entre cristas; serra e subserra; centro da cidade.
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A serra com elevador panorâmico proporcionaria visão deslumbrante de Belo Horizonte |
Continuando as exposições
artificiais agora da cidade, descendo a Raja Gabaglia podemos ver o que o poema
sugere; “Passe no talude rude de onde o bloco cadente do impuro quartzito sobre
o filito luzente, rola na ribanceira ameaçando o vivente, e entra na procissão
de costumeira torrente que desce à contramão desafiando o tenente; triste fim
da formação neste momento presente, ela que foi esmagada, comprimida,
estilhaçada por força mais competente, e merecia afinal descanso mais natural
que a todo ser se consente, à sombra do bambuzal, à margem do rio corrente lavada
pelo caudal de pureza reluzente”.
Mais abaixo se
vê o talude mais comportado e resistente do grupo Sabará e já chegando ao
Arrudas na depressão periférica que reverencia a formidável cadeia, blocos e
placas de itabirito e quartzito, escondidos, com seixos rolados de gnaisses
visíveis na Câmara Municipal.
A engenharia
mineral, mãe de todas as demais, não se fez esperar e seguindo os geólogos naturais
ou preparados, repetindo o que já fez no mundo todo, tirando a humanidade das
cavernas, elevou a terra do queijo a nível mais promissor que o até hoje
alcançado pelas Minas e pelos Gerais. A serra com suas exposições naturais e
artificiais, é, para quem tenha olhos de ver, uma das paisagens geologicamente
mais instrutivas do Brasil, entretanto com perigos e feiuras que devem ser
controlados ou pelo menos mitigados (aproveito a ocasião, para estimular o
otimismo dos leitores que conheçam bem a área, para perguntar-lhes se se
lembram do verdadeiro canyon erosivo
que acaba de desaparecer à esquerda de quem sobe a 356, logo após o viaduto do
ramal ferroviário de Águas Claras.
Para
proporcionar ao belo-horizontino apaixonado uma visão de deleite e instrutiva,
eu já teria dado à serra um acesso de subida por elevador nas pedras rubras e
uma descida panorâmica por teleférico a um dos montes da sub serra do Cercadinho,
que, para quem vem de sudoeste para nordeste ou que esteja a cavaleiro numa
imagem zenital os magníficos portais formados entre a serra, a subserra, tendo
a depressão do Gandarela de permeio.
Belo Horizonte, julho de 2015
Edézio Teixeira de Carvalho
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