MINERAÇÃO E SEUS
PRODUTOS INVISÍVEIS
GC 399 Mineração
Leio em “Colapso” de Jared Diamond que Montana, belíssimo
estado montanhoso dos Estados Unidos, caiu do 10º lugar em PIB per capita entre
os estados federados para o 46º. Tornou-se o estado, portanto, dos mais ricos,
para posicionar-se entre os mais pobres. Não se atribui a causa exclusivamente
à opção por fechar grande parte dos empreendimentos minerais em virtude do
altíssimo custo de reabilitação das áreas degradadas pela drenagem ácida e resíduos
pesados (cobre, zinco, cádmio), mas também à degradação do solo pelas macieiras
que teriam esgotado as reservas naturais de nitrogênio.
Em Minas Gerais uma das primeiras manifestações
contemporâneas da atividade mineral foi
condenada numa única frase atribuída ao político mineiro Artur Bernardes aí
pelos anos 20 do século passado: “Minério não dá duas safras”. Daí ao “Minas
fica com os buracos” é consequência lógica. Ninguém poderá negar que justa razão está presente
nessas manifestações. Por outro lado a realidade das duas safras ocorreu em
Minas sem metáforas do ouro ao ferro em 200 anos de intervalo, entre picos
havendo outras safras menos votadas, como a do Nióbio, contemporâneo, a das
pedras ornamentais e tantas outras por serem simplesmente diferentes do ouro,
do diamante, do ferro, e até dos materiais menos nobres como as areias, os
cascalhos, as moinhas de rocha das pedreiras. Pois se nos ficaram buracos,
interpretemo-los em suas possibilidades às vezes extraordinárias que não vemos,
como nem o poeta maior viu por serem de início supostamente feias... Ainda
explorando exposição alheia do citado Jared Diamond, diz ele que os filhos de
Montana não ficam mais em Montana. Terá feito o estado a boa troca de uma
população reclamando da poluição doméstica para ir viver a de outras atividades
em terra alheia? Ou não sabemos mais ou nunca soubemos que o que não se produz
aqui, ou terá de ter substitutos ou se produzirá acolá, pelo evidente princípio
do vaso fechado?
Hoje o sofrimento bateu à porta de centenas de famílias em
Bento Rodrigues; amanhã muitos mais sofrerão a forma amenizada inversamente
proporcional à distância ao foco.
É verdade que barragens de rejeitos e sem componentes
tóxicos podem constituir importantes aquíferos artificiais, mas isto é
invisível ou pode ser, e é justo que se diga, insuficiente para compensar a
redução do NA nas cavas muito grandes.
Por outro lado o aspecto negativo evidente parece ser
preservado com zelo pelos inimigos da atividade como a constituírem um libelo
contra ela. Como setor econômico, não muito ou nada fez para melhorar a
visibilidade dos seus benefícios para a sociedade e para amenizar os impactos
negativos com uma atitude menos antipática perante essa sociedade que a rodeia
sem saber que está por ali por causa dela.
Não se vê, por exemplo, uma mineradora demonstrar simpatia
pela população que a envolve patrocinando a atividade educativa nas aberturas
do sistema geológico dadas como definitivas enquanto perdurar a atividade
produtiva, nos domingos, por exemplo. Nem aquela casa que foi a CASA COR
mostrando uma calçada de pedras São Tomé com magníficas dendrites nas placas de
quartzito chama atenção da população porque não foram agrupadas as pedras com
dendrites a chamar a atenção do leigo distraído. Com exceção do pessoal que
opera as minas quase mais ninguém tem acesso a pontos do terreno dotados de
vistas espetaculares, senão, quando muito por montanhistas e outros praticantes
de esportes radicais, quando alguns desses locais, especialmente escolhidos
poderiam ser dotados de acessos especiais como por teleféricos, elevadores
(falo agora pensando num hipotético elevador ao pé da escarpa final da serra do
Curral, por exemplo exibido atrás do hospital existente próximo à praça do Papa
(uma versão mineira de outros recursos turísticos vistos em outros pontos do
país). Um time de futebol, de vôlei, basquete ou trupe teatral, patrocinado
pela mineração também não se vê, assim como um jardim botânico, zoológico,
museu. De cada empreendimento mineiro não se vê, por exemplo, ou distraído sou
eu, sua participação na reabilitação de áreas degradadas por processos naturais
ou pela própria mineração anterior à atual que não tenha tido um PRAD bem
concebido e executado na época certa.
Finalmente a atividade atual verá chegada a hora de fechar
as portas e isto é feito pela forma menos dispendiosa possível ou simplesmente
não é feito.
Exemplos de aproveitamento de áreas mineradas? O patrimônio
cultural da humanidade em Las Medulas é grande exemplo. O complexo minerário da
Serra do Curral, que poderia ser ou tornar-se, contém pelo menos 3 grandes
cavas com água (1de formação ferrífera e 2 de dolomito), pilhas de estéril,
pelo menos uma grande barragem de rejeito voltada para Nova Lima. Durante a
vida útil da minas a céu aberto nunca vi aproximação maior com as cidade de
Belo Horizonte e Nova Lima. Na aproximação que poderia ter sido feita seria de
incluir a recepção sistemática de excursões estudantis, o acesso a cavas aos
domingos e o acesso diário à crista da serra mediante teleféricos e/ou
elevadores (estes auto-financiados para o turismo inclusive nos dias úteis).
Não faz sentido no complexo urbano metropolitano superposto
pelo complexo minerário da serra agir com cada mina ou cava individualmente. Um
plano deve ser feito para o conjunto todo e isto não excluiria o exemplo de Las
Médulas.
E então ocorre lembrar os garbosos cavalos ingleses que
emprestaram sua força a comparar com a da locomotiva que os substitui nas ruas
de Londres, num dia em que o primeiro desastre urbano debitado ao combustível
geológico chamado carvão ou por eles coal
tirou a vida a um distraído londrino debitando à mineração sua primeira
fatalidade à vista de outros transeuntes que talvez não estivessem muito
atentos aos males do grisu que a tantos matou antes que uma pilha de estéril em
escorregamento matasse mais de 200, incluindo 64 pequeninos numa escola maternal
da mineira aldeia de Aberfan em Gales. Ainda atualmente sabemos das inúmeras
perdas humanas em minas de carvão chinesas, das menos frequentes na Europa
Oriental e das já quase inexistentes na Ocidental. E a poética Praga, que já
sofreu com abatimentos de minas a ela subjacentes? Sofre hoje mais com o
furioso Vltava, de que foi tirado o leito maior no século passado na expansão
da bela capital.
A mineração é atividade que provoca acidentes diferentes dos
associados a outras atividades, como a do simples escolher onde morar, comprar,
vender e a das grandes construções viárias (rodo, ferro, hidro).
No caso da mineração existe circunstância a mais a esconder
seus benefícios e a explicitar suas desvantagens: deixa ela rastros indeléveis
nas terras mineradas: buracos, montes, crateras, ravinas, barragens, às vezes
perigosas, de rejeitos, nascentes e cursos d’água contaminados, lençóis
freáticos contaminados também por substâncias nocivas como metais pesados,
ácidos e outras.
Se as cavas forem ficando livres em tempos diversos nada
impediria que o plano contivesse etapas de implementação sucessivas.
Considerações
finais
Talvez exagerando
em repetições, o Homem é o único componente da natureza capaz de corrigir seus
desvios propositadamente, ou de provocar novos desvios. Muito antes de destruir
belos acidentes da natureza, o Homem na prática da mineração, buscando
transferir as substâncias úteis do lugar errado para o lugar certo, ainda que
correndo o risco de mudar para piores os aspectos constitutivos e
fenomenológicos da natureza, tem oferecido possibilidades notáveis de mudar
para melhores muitos desses aspectos. Procurá-los é outra arte que a própria
atividade mineral poderá não fazer sozinha. Então façâmo-las por ela, porque o
simples remover da mineração não é solução para nada.
Fig. 5: Dendrites escondidas na dispersão de uma calçada são invisíveis.
Agrupadas, lembrando chinesices, ornamentam a calçada, o muro, a fachada e
ajudam a instruir geologicamente um povo.
Belo Horizonte, 07 de dezembro de 2015
Edézio Teixeira de Carvalho
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