23 de janeiro de 2017

Tributo devido aos colombianos

GC 416 TRIBUTO AOS COLOMBIANOS

            Em 1903 aconteceu o que terá sido o acidente geológico de segunda maior repercussão direta quanto a perdas de vidas humanas no continente americano, só perdendo para o recente terremoto do Haiti. Trata-se da erupção vulcânica na Martinica do vulcão da Montaigne Pelée, que, não sem dar avisos suficientes para que a população de Saint Pierre pudesse escapar, matou cerca de 30.000 pessoas. A morte não veio por torrentes de lavas, como acontece em erupções não explosivas, mas sob a forma de nuvens ardentes. Muitos morreriam por certo, mas não tantos, não houvesse a administração local bloqueado vias de fuga para impedir a redução de votantes de uma eleição.
Passados 82 anos vem o segundo maior desastre geológico do século XX, que varreu quase totalmente  Armero na Colômbia, agora por via indireta, consequente à erupção do Nevado Del Ruiz, que provocou a fusão do capuz de gelo e projetou grande quantidade de material piroclástico. Nesse caso o que se chama lahar (massa expelida do vulcão, água da fusão do gelo, solo, rochas, árvores das partes mais baixas da montanha, toda essa massa em movimento) desceu estrepitosamente sobre a cidade por volta da meia noite matando 25.000 pessoas de um total estimado em 28.500.
Imagem do dia: Aspecto de Armero após ter sido inundada pelo lahar.
Origem: USGS - www.geology.sdsu.edu/how_volcanoes_work/nevado acessado a 4 de dezembro de 2016

O documento chamado Casos de Estudo: As Torrentes de Lama (mudflows) do Nevado Del Ruiz (Colômbia) – 13/11/1985 com elementos de apoio de J. Alveirinho Dias (Geologia Ambiental 99 Mar 06) Relatório 2/6 da UNDRO United Nations Disaster Relief Organization, dá relato complementar ao que eu já tinha consultado e ouvido diretamente de participantes (pesquisadores da Universidade EAFIT de Medellin) do Simpósio Latino-Americano de Risco Geológico Urbano. Associação Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental – ABGE – São Paulo SP, 1990. Do autor acima consta o seguinte comentário final:
“Quando as equipas de socorro chegaram a Armero, no dia 14, depararam com o horrível. Era o caos! O que viram foi uma massa confusa de pedras, árvores, restos de casas, carros e corpos mutilados integrados numa matriz de lama cinzenta. Alguns sobreviventes agonizavam nesta massa enquanto outras pessoas faziam tudo o que podiam para as salvar. Dispersos no depósito do lahar estavam mais de 23 mil pessoas que tinham perecido, juntos com restos de 4500 casas que tinham sido destruídas e os corpos de mais de 15000 animais mortos. Os prejuízos financeiros foram estimados em mais de um bilião de dólares, ou seja, cerca de um quinto do Produto Nacional Bruto da Colômbia. No entanto, as medidas de socorro foram lentas e, frequentemente, pouco eficazes. Na análise deste caso tem que se ter em consideração que o governo colombiano estava na altura profundamente empenhado na luta contra os movimentos revolucionários que, desde Junho de 1985, tinham reiniciado a luta de guerrilha. Entre 6 e 9 de Novembro (imediatamente antes da catástrofe) o M-19 (movimento 19 de Abril) tinha mesmo ocupado o Palácio da Justiça em Bogotá. Actualmente o vale começa a estar novamente ocupado. O vulcão está a ser monitorado.”
Acrescento pontos que têm a ver com a decisão de escrever o artigo: Convivi com estudante de Bucaramanga, no LNEC, Portugal, em 1979, que me deixou impressionado por excepcional fidalguia; o acidente de Armero poderia ter sido evitado ou ter enfrentado consequências minimizadas se o urbanismo tivesse sido guiado por referência geológica de cunho territorial, como deveriam também ser as faixas marginais do Pacífico e do Índico, contra os tsunamis, evitando urbanizar para habitações a orla baixa, o que parece não ter sido observado nem por cuidadosos japoneses; vi o Mário Sérgio jogar uma vez pelo Vitória, em novembro de 1972, em Salvador, contra o América mineiro, e nunca mais o vi ao vivo em campo, mas ter-lhe-ia feito agradecimento especial se o encontrasse, pela inigualável arte demonstrada em dribles, da qual só por milagre escapou o América.
País que enfrenta a fúria da natureza com frequência maior que outros, que chega a bom termo na desavença interna como o faz a Colômbia, aprende mais cedo a conviver com a Terra, e é mais capaz de transbordar de amor pelo país irmão, merecendo o sincero tributo do reconhecimento pelo atendimento dado à comitiva da Chapecoense e aos que a acompanharam no sinistro de falha humana que os colheu.
Quanto a nós, espero que saibamos evitar o tsunami social que se abre sobre Brasília.
              
Belo Horizonte, 4 de dezembro de 2016.
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Edézio Teixeira de Carvalho
Engenheiro Geólogo

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