GC
416 TRIBUTO AOS COLOMBIANOS
Em 1903 aconteceu o que terá sido o
acidente geológico de segunda maior repercussão direta quanto a perdas de vidas
humanas no continente americano, só perdendo para o recente terremoto do Haiti.
Trata-se da erupção vulcânica na Martinica do vulcão da Montaigne Pelée, que, não sem dar avisos suficientes para que a
população de Saint Pierre pudesse escapar, matou cerca de 30.000 pessoas. A
morte não veio por torrentes de lavas, como acontece em erupções não
explosivas, mas sob a forma de nuvens ardentes. Muitos morreriam por certo, mas
não tantos, não houvesse a administração local bloqueado vias de fuga para
impedir a redução de votantes de uma eleição.
Passados
82 anos vem o segundo maior desastre geológico do século XX, que varreu quase
totalmente Armero na Colômbia, agora por
via indireta, consequente à erupção do Nevado Del Ruiz, que provocou a fusão do
capuz de gelo e projetou grande quantidade de material piroclástico. Nesse caso
o que se chama lahar (massa expelida
do vulcão, água da fusão do gelo, solo, rochas, árvores das partes mais baixas
da montanha, toda essa massa em movimento) desceu estrepitosamente sobre a
cidade por volta da meia noite matando 25.000 pessoas de um total estimado em
28.500.
Imagem do dia: Aspecto de Armero após ter sido inundada pelo lahar.
Origem: USGS - www.geology.sdsu.edu/how_volcanoes_work/nevado acessado a 4 de dezembro de 2016
O
documento chamado Casos de Estudo: As Torrentes de Lama (mudflows) do Nevado
Del Ruiz (Colômbia) – 13/11/1985 com elementos de apoio de J. Alveirinho Dias
(Geologia Ambiental 99 Mar 06) Relatório 2/6 da UNDRO United Nations Disaster
Relief Organization, dá relato complementar ao que eu já tinha consultado e
ouvido diretamente de participantes (pesquisadores da Universidade EAFIT de
Medellin) do Simpósio Latino-Americano de Risco Geológico Urbano. Associação
Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental – ABGE – São Paulo SP, 1990.
Do autor acima consta o seguinte comentário final:
“Quando as equipas de socorro chegaram a
Armero, no dia 14, depararam com o horrível. Era o caos! O que viram foi uma
massa confusa de pedras, árvores, restos de casas, carros e corpos mutilados
integrados numa matriz de lama cinzenta. Alguns sobreviventes agonizavam nesta
massa enquanto outras pessoas faziam tudo o que podiam para as salvar. Dispersos
no depósito do lahar estavam mais de 23 mil pessoas que tinham perecido, juntos
com restos de 4500 casas que tinham sido destruídas e os corpos de mais de
15000 animais mortos. Os prejuízos financeiros foram estimados em mais de um
bilião de dólares, ou seja, cerca de um quinto do Produto Nacional Bruto da
Colômbia. No entanto, as medidas de socorro foram lentas e, frequentemente,
pouco eficazes. Na análise deste caso tem que se ter em consideração que o
governo colombiano estava na altura profundamente empenhado na luta contra os
movimentos revolucionários que, desde Junho de 1985, tinham reiniciado a luta
de guerrilha. Entre 6 e 9 de Novembro (imediatamente antes da catástrofe) o
M-19 (movimento 19 de Abril) tinha mesmo ocupado o Palácio da Justiça em
Bogotá. Actualmente o vale começa a estar novamente ocupado. O vulcão está a
ser monitorado.”
Acrescento
pontos que têm a ver com a decisão de escrever o artigo: Convivi com estudante
de Bucaramanga, no LNEC, Portugal, em 1979, que me deixou impressionado por
excepcional fidalguia; o acidente de Armero poderia ter sido evitado ou ter
enfrentado consequências minimizadas se o urbanismo tivesse sido guiado por
referência geológica de cunho territorial, como deveriam também ser as faixas
marginais do Pacífico e do Índico, contra os tsunamis, evitando urbanizar para
habitações a orla baixa, o que parece não ter sido observado nem por cuidadosos
japoneses; vi o Mário Sérgio jogar uma vez pelo Vitória, em novembro de 1972,
em Salvador, contra o América mineiro, e nunca mais o vi ao vivo em campo, mas
ter-lhe-ia feito agradecimento especial se o encontrasse, pela inigualável arte
demonstrada em dribles, da qual só por milagre escapou o América.
País
que enfrenta a fúria da natureza com frequência maior que outros, que chega a
bom termo na desavença interna como o faz a Colômbia, aprende mais cedo a
conviver com a Terra, e é mais capaz de transbordar de amor pelo país irmão,
merecendo o sincero tributo do reconhecimento pelo atendimento dado à comitiva
da Chapecoense e aos que a acompanharam no sinistro de falha humana que os
colheu.
Quanto
a nós, espero que saibamos evitar o tsunami social que se abre sobre Brasília.
Belo Horizonte, 4 de dezembro de
2016.
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Edézio
Teixeira de Carvalho
Engenheiro
Geólogo
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